domingo, 25 de março de 2012

O CAPITÃO ALATRISTE

As saudades que eu já tinha de ler um livro de capa e espada! Zorro, D' Artagnan e os mosqueteiros Athos, Aramis e Porthos, Ivanhoe e Robin dos Bosques a esgrimir as suas espadas em favor dos oprimidos e em defesa do seu bom nome, face a múltiplos adversários mal intencionados e malvados, pois, há quanto tempo? Desde as carteiras de liceu, fora um ou outro novo remake cinematográfico, que se foi espreitar mais por curiosidade, pois a história está visto que se sabe de cor e salteado. Então, a esta fila de heróis, junta-se agora o capitão Alatriste...

O primeiro facto digno de nota  nas suas 173 paginas é  que, ao contrário das histórias ficcionais de Alexandre Dumas, Walter Scott ou do mais desconhecido Johnston McCulley, o enredo do livro enquadra-se numa época específica e muitos dos seus personagens são reais, sendo que só a trama principal é obra da imaginação do autor. Mais, essas personagens não são só reis, rainhas, príncipes e princesas, mas os membros da corte, os tenebrosos inquisidores, os aguazis (oficiais de polícia), militares, poetas, dramaturgos e pintores da época, com os quais o nosso capitão confraterniza amiúde na Taberna do Turco. Assim, não sendo um livro de História, retrata-a parcialmente, dando também a conhecer a mentalidade das gentes daquele tempo, aparentemente tão tementes a Deus, mas cuja ambição desmedida provoca múltiplos conflitos e atentados. E é aí que entra o nosso capitão, que de capitão só tem alcunha: "Não era o homem mais honesto nem o mais piedoso, mas era um homem valente. Chamava-se Diego Alatriste y Tenorio e tinha lutado como soldado nos antigos terços nas guerras da Flandres. Quando o conheci sobrevivia em Madrid alugando os seus serviços por quatro maradevis em trabalhos de pouca glória, amiúde na qualidade de espadachim por conta de outros que não tinham a destreza ou o arrojo para solucionar as suas próprias querelas."

É assim que certo dia o capitão e um assassino italiano são confrontados perante dois cidadãos embuçados e  de alto cargo, que lhes encomendam o serviço de pregar um valente susto a dois ingleses e de lhes roubar a documentação que deverão entregar num local estipulado, em troca de uma boa maquia. Mas a questão complica-se, pois se o funcionário mais importante avisa que o serviço não é para matar nenhum dos homens, já depois deste sair surge o inquisidor frei Emílio Bocanegra a exigir a morte de ambos, ameaçando-os de lhes pôr a Inquisição à perna em caso de incumprimento. Quando está prestes a executar um dos britânicos, algo faz estacar Alatriste, que  não só os salva da morte certa, como impede o italiano de a intentar. E agora, como é que o capitão se vai safar das garras da Inquisição ou de apodrecer com os ossos na prisão, por ordem de um alto funcionário do reino?

Há muito que tinha curiosidade de ler Arturo Pérez-Reverte e, como eu, alguns companheiros do Clube de Leitura - que recentemente se alargou a mais dois elementos, daí já não sermos só "meninas" - pelo que a leitura agendada calhou neste "O Capitão Alatriste", o primeiro de uma série de aventuras deste herói por terras de Espanha no século XVII, em pleno reinado filipino. Gostei da escrita, onde por vezes intercala alguns versos genuínos dos poetas daquele tempo (supostos companheiros de tertúlias do capitão), da narração estar a cargo de um puto de 13 anos (Íñigo Balboa, pajem do capitão) que por vezes não entende a realidade que o rodeia, de nos dar a conhecer as intrigas da corte, da análise que não deixa de fazer à sociedade da época, além da história que, não sendo igual à dos clássicos, também não destoa do género. Destaque-se ainda que se supõe que o escritor resolveu escrever este livro ao constatar, no livro de História da filha, que este período tão conturbado não merecia mais de página e meia... En garde!  

CITAÇÕES:
"Uma Espanha ainda temível no exterior mas que, apesar da pompa e do artifício, do nosso jovem e simpático rei, do nosso orgulho nacional e dos nossos heróicos feitos de armas, se deitara a dormir confiante no ouro e na prata que traziam os galeões das Índias. Mas esse ouro e essa prata desapareciam nas mãos da aristocracia, do funcionalismo e do clero, preguiçosos, corruptos e improdutivos, e esbanjavam-se em empresas vãs, como a manutenção da dispendiosa guerra reatada na Flandres, onde colocar um pique, ou seja um novo piqueiro ou soldado, custava os olhos da cara. [...] Aragoneses e catalães escudavam-se nos seus foros, Portugal continuava preso por alfinetes, o comércio estava na mão de estrangeiros, as finanças eram de banqueiros genoveses, e ninguém trabalhava excepto os pobres camponeses, exauridos pelos cobradores da aristocracia e do rei."

"Nem ele [Felix Lope Vega Carpio], nem dom Francisco de Quevedo, nem Velázquez, nem o capitão Alatriste, nem a época miserável e magnífica que então conheci, existem já. Mas resta, nas bibliotecas, nos livros, nas telas, nas igrejas, nos palácios, ruas e praças, a marca indelével que aqueles homens deixaram a sua passagem pela Terra. [...] Mas o eco das suas vidas continuará a ressoar enquanto existir esse lugar impreciso, mistura de povos, línguas, histórias, sangues e sonhos traídos: esse cenário maravilhoso e trágico a que chamamos Espanha."

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A próxima sessão do Clube de Leitura foi agendada para dia 12 de Maio, com o livro "A Sul da Fronteira, a Oeste do Sol", de Haruki Murakami.

16 comentários:

  1. Com que sofreguidão lia esses livros e mais que uma vez! Vou já pesquisar o sistema de bibliotecas públicas e requisitar o livro. Preciso de um herói.
    Abraço

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  2. Vi o filme. O Viggo Mortensen era o Alatriste. É um razoável filme de capa e espada.
    Do Haruli Murakami nunca li nada, embora cá tenha 2 livros dele. Mas tenho tantos em fila de espera...
    Só na mesa de cabeceira tenho 3 :)
    Boa semana, Teté

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  3. Li o "clube Dumas", dele, e vi o filme «A 9ª Porta», interpretado desse livro pelo Polanski. Muito bons :) Deste, Alatriste, vou ver o filme :)

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  4. Só li um livro do Perez Reverte, mas não me lembro do nome. Era a descrição de uma batalha, pelos olhos de um orgulhoso espanhol. Gostei da escrita. Do Murakami, que me perdoem todos os intelectuais deste país, não gosto mesmo nada.
    Bjs

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  5. E não precisamos todos de heróis, CATARINA? E que venham eles, para alegrar os nossos dias... :)

    Abraço!

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  6. O filme ainda não vi, VIC, mas sei que existe e é só questão de o apanhar aí a jeito... :)

    De Haruki Murakami só li um livro e gostei. Mas para conhecer melhor um escritor é bom que se leia mais alguns livros dele! Mas estou como tu, especialmente após fazer anos: já tenho mais de uma prateleira de livros em fila de espera... ;)

    Boa semana para ti também!

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  7. Uma amiga também me falou desse "Clube Dumas", MOYLITO, os filmes vão ter de esperar melhor oportunidade... :))

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  8. Também gostei da escrita, TERESA, esse livro não imagino qual seja. Mas hei de ler mais dele!

    Do Murakami só li "Sputnik, meu amor!" e gostei. Mas não dá para conhecer um escritor só por um livro, daí até calhar bem a leitura deste... :)

    Beijocas!

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  9. O primeiro parágrafo poderia ter sido escrito por mim, rrsss

    Este autor desperta-me curiosidade, pois gostei de uma sua entrevista que li.

    Dorme bem

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  10. Já requisitei o livro “O capitão Alatriste” tanto em livro como em livro-áudio; tenho 3 e 2 pessoas à minha frente, respetivamente; aproveitei e tb requisitei o “The painter of battles” do mesmo escritor e o “South of the Border, West of the Sun”. Como gosto de bibliotecas! : )

    Os outros que estão aqui em fila de espera... podem continuar a esperar.
    Abraço

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  11. Um livro que retrata a história e que coloca a Igreja como mandante no assassinato de pessoas? Impossível, a roçar a heresia!

    Beijocas!

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  12. Também estou entusiasmada em ler mais dele, SÃO! Acontece com os livros que gostamos... :)

    Quanto ao primeiro parágrafo poder ser escrito por ti, acredito, todos vamos apanhando mais ou menos os mesmos barcos! :D

    Dormi, sim, obrigada!

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  13. Por acaso tenho de indagar se por aqui há alguma biblioteca que funcione, CATARINA. Sei que há umas itinerantes, mas essas saber o dia e hora em que passam e onde passam já é mais complicado...

    Mas pronto, pelo que percebo é encomendar, ler e devolver. No caso da pessoa fazer grande questão, depois pode comprar o livro... :)

    Abraço!

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  14. Em abono da verdade, não era a Igreja a encomendar o assassínio, RAUF, mas o inquisidor ou, vendo as coisas por outro prisma, a Inquisição. Apesar de tudo ainda há uma pequena diferença... :))

    Beijocas!

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  15. Como te disse ontem, faz tempo que ando para descobrir este autor, mas ainda não se proporcionou.
    Agora com a tua opinião positiva fica mais a vontade de não o deixar de ler. ;)
    Boas leituras

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  16. Este foi bom para começar, pois ninguém o tinha lido, TONS DE AZUL, e o livro não é um calhamaço como outros do autor... :))

    Para a próxima já nos podemos aventurar, porque todos gostámos! :)

    Boas leituras para ti também!

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Sorri! Estás a ser filmad@ e lid@ atentamente... :)