"O Gungunhana era o chefe de uma das tribos mais guerreiras da África Ocidental - os vátuas. Os guerreiros do Gungunhana ameaçavam a cidade de Lourenço Marques e nas suas imediações mataram colonos e roubaram gados. [...] Mousinho de Albuquerque, que se distinguira nestas campanhas como oficial de cavalaria, decidiu prender o Gungunhana. Debaixo de chuvas torrenciais e acompanhado apenas de três oficiais e quarenta e seis soldados europeus, dirigiu-se à povoação de Chaimite onde o régulo vátuo se tinha refugiado. No caminho encontraram milhares de guerreiros que podiam facilmente matá-los, mas que vinham submeter-se. [...] Dentro do recinto, Mousinho desembainhando a espada correu sobre alguns negros que, armados de espingardas, pareciam querer atacar. Mandou atar as mãos atrás das costas ao Gungunhana e sentá-lo no chão, o que, para os negros era sinal de este estar vencido."
In "História de Portugal" (4ª classe e exame de admissão aos liceus e escolas técnicas), 3ª edição, do professor Janeiro Acabado.
Era o que rezava a minha "História de Portugal" da primária*, e se a professora e o livro afirmavam, qual era a catraia de 8 ou 9 anos que se atrevia a duvidar, lá para o final dos anos 60 do século passado?
A que propósito vem esta conversa? Já há mais de um ano escrevi sobre o programa televisivo "A Alma e a Gente", apresentado por José Hermano Saraiva, que recentemente foi comentado, dando uma nova luz aos factos relatados pelo ilustre professor. Segundo o livre pensador moçambicano, a diferença deveu-se ao uso de metralhadoras: "46 homens brancos contra três mil negros armados de algumas escopetas inglesas, é o que o Professor Saraiva vos quiz dizer. E não foi por causa dos RAMBOS (se é que alguma vez os houve em terras lusas), mas sim da invenção da metralhadora! Foi a primeira vez que em Moçambique que se usou aquela arma que dizimou dezenas de negros à primeira rajada, justamente a primeira leva deles, que estavam equipados de espingardas inglesas. Depois, os cavalos e os sipaios africanos (auxiliares) a pé e com lanças fizeram o resto...."
Claro que assim a história se torna mais verosímil, mas verdade é que nem Janeiro Acabado nem José Hermano Saraiva se referiram a esse "pequeno pormenor", que faz uma enorme diferença...
* Nota - o livro não é exactamente o mesmo por onde estudei, porque o meu avô o pediu emprestado uns anos mais tarde, para conferir alguns dados históricos da sua colecção de numismática e caiu na asneira de o emprestar a um numismata amigo. Nunca mais o viu, evidentemente, suponho que encontrou o presente exemplar num alfarrabista e "devolveu-o" com uma capa igual em tudo, excepto na cor: de azul marinho, vinha com uma capa cinzentinha e páginas mais amarelecidas. Mas, fazer o quê? Acontece a todos...
Imagem da net.
mas olha que, no espírito pelo menos, os manuais actuais não são muito diferentes. é conveniente "esquecer" pormenores, nomeadamente técnicos, porque depois é a bravura e os genes superiores que sobram para explicar os factos.
ResponderEliminarSó vim buscar o link do teu blogue que, imperdoavelmente, ainda não tinha lá no nosso estaminé.:))
ResponderEliminarVoltarei depois para te ler.
jinhos
Li o teu texto com toda a atenção, Teté.
ResponderEliminarPenso que é impossível ser-se 100% objectivo ao relatar ou explicar factos.
Bravura e genes superiores de 46 soldados contra três mil africanos, com o "esquecimento" de que os primeiros já iam armados de metralhadoras, MOYLITO? Sorry lá, há "esquecimentos" e distorções mesquinhas dos factos, indignas dos verdadeiros historiadores... ~xf
ResponderEliminarFelizmente que já não leio esses "novos" manuais, quando preciso que saber qualquer coisa simples utilizo ou este livro da 4ª classe ou a wiki, coisas mais complicadas consulto enciclopédias ou livros mais sérios! Passo-me um bocado com factos notoriamente distorcidos, quer de historiadores, quer de jornalistas... ;)
A história tem sempre muitas versões. Nunca saberemos a verdadeira.
ResponderEliminarHá muitas luas que não ouvia falar de Gungunhana, mas não me admirava nada que este Régulo tenha caído aos pés dos portugueses da mesma forma que evangelizámos os nativos de todos os locais por onde passámos, ou seja, à força!
beijinho Tété
OK, NINA! :)
ResponderEliminarJinhos e as melhoras!
Concordo que relatar factos com 100% de objectividade é difícil, EMATEJOCA, tanto da parte de historiadores como de jornalistas. Daí à total distorção dos factos (no caso, esquecendo um "pormenor" deste género), vai um passo gigante... ;)
ResponderEliminarE não fico menos patriota por isso! E óbvio que também não critico que tenham usado as armas necessárias para sustentar aquilo que a seus olhos seria uma rebelião, que os tempos eram outros, ninguém se pode armar em "juiz" de antepassados tão longínquos, com uma mentalidade tão diferente da que reina actualmente... :)
Claro que há várias versões da História, KIM, ninguém põe isso em causa.
ResponderEliminarE estás cheio de razão em relação ao Gungunhana, que na foto é ele e as suas 7 mulheres (segundo a net), mas após a detenção foi exilado, salvo erro para os Açores, e evangelizado à força! Era normal, na época... :)
Beijocas, amigo!
Costuma-se dizer que quem conta um conto acrescenta um ponto. Ao que parece neste caso o facto histórico aponta para muitos outros pontos de mira.
ResponderEliminarUm bocado de irrealismo, com coisas passadas há tantos anos, é admissível, PAULOFSKI!
ResponderEliminarAgora - e suponho que será verdade, pois a referida metralhadora foi inventada em 1884 e usada pelos ingleses em África, pelo que será presumível que 11 anos depois os portugueses também as tivessem adquirido para o "efeito" - já é mais difícil que haja desconhecimento ou esquecimento em relatar esse pormenor, que faz uma enorme diferença... ;)
pois, exacto, mas era de esperar que as coisas tivessem mudado bastante. o que é certo é que, na realidade... não!
ResponderEliminarOlha, a seguir ao 25 A mudaram um bocado, MOYLITO, mas vale que foi de curta duração. Porque também não havia pachorra para aturar teorias de gajos actuais, em grandes loas ao socialismo marxista e tal, e a achincalhar todo o passado recente (capitalista e colonialista) ou a distante monarquia, parecendo que só a I República se safava. Topas?! Um período calminho, em que correu tudo sobre rodas... tanto que os ministros rodavam muito! :z
ResponderEliminarMas sim, seria de esperar que mesmo aproveitando relatos de historiadores do passado, não caíssem neste heroísmo um bocado patético... :-t