Neste romance, Murakami convida os leitores a serem observadores de uma noite em Tóquio, em que uma espécie de câmara de filmar imaginária segue os passos de três personagens - Mari, Takahashi e Shirakawa - enquanto, de tempos a tempos, se debruça sobre a cama onde Eri, a irmã de Mari, dorme profundamente. Ou será que está presa nalgum sonho ou pesadelo?
"Aproxima-se a meia-noite, o ponto alto da sua actividade já passou, mas o metabolismo vital que assegura a vida continua a trabalhar incessantemente, produzindo o 'basso' contínuo que reproduz os murmúrios da cidade, um som monótono, sem altos nem baixos, se bem que prenhe de pressentimentos", escreve o autor logo na primeira das 224 páginas. Assim, vão-se sucedendo vários encontros entre Mari e Takahashi, que se conheceram vagamente poucos anos atrás, ambos estudantes mas que não parecem ter muito em comum para além da solidão, ou talvez também a insegurança da juventude.
Mas na noite citadina cruzam-se outras personagens, como a gerente de um hotel de amor que precisa de ajuda para entender o que aconteceu à prostituta ilegal chinesa que foi espancada e roubada por um cliente, o funcionário sobrecarregado de serviço que perpetrou o crime, o mal encarado motoqueiro que transporta as prostitutas para os serviços ou a empregada de limpeza que foge do seu passado. É uma noite como tantas outras, onde só temos um breve relance da realidade de cada uma dessas vidas, que escondem os seus dramas, angústias, tristezas e incertezas. Embora aparentemente pacífica e sem sobressaltos, como o sono pesado de Eri, esse povoado de fantasmas que apenas se adivinham...
Tal como a Manuel Cardoso - para quem não sabe, vou sempre espreitar se ele já leu o livro e a apreciação que fez - a lenda dos três irmãos que foram ao mar para pescar, mas apanharam uma tempestade e foram parar a uma ilha deserta com uma enorme montanha, referida logo no início, parece-me ser um dos motes do enredo. E em vez de citações, resumo o resto da lenda: Quando chegaram à ilha, um deus apareceu-lhes em sonhos e disse que iriam encontrar três grandes rochedos redondos, que cada um rolaria até onde lhe aprouvesse, e no sítio onde escolhessem parar ali ficariam a viver. "Quanto mais alto subir, tanto mais vasta será a vossa visão do mundo." Mas os rochedos eram grandes e pesados, e depressa o irmão mais novo desistiu da tarefa e ficou junto à praia, onde teria peixe para pescar, desistindo de ver o mundo. Os outros dois continuaram a árdua tarefa de rodar os pedregulhos, mas a meio da encosta o segundo desistiu, pois teria frutos em abundância para sobreviver, não se importando de não ver grande coisa do mundo. O mais velho continuou a ascensão, embora em condições cada vez piores, mas não desistiu, empurrou o rochedo durante meses até chegar ao alto da montanha. As plantas e animais escasseavam, a alimentação era difícil, a água era a do gelo, "mas não estava arrependido, pois conseguia avistar o mundo inteiro". A lenda também serve de explicação para existir um enorme rochedo num cume de uma montanha numa ilha havaiana.
É sempre um prazer ler Murakami, mesmo que tenha preferido outros livros do grande escritor japonês, que já há alguns anos é um sério candidato ao Nobel da Literatura. Será que o facto de ter grande sucesso de vendas a nível mundial impede a Academia sueca de lhe entregar o galardão?
Talvez deva debruçar-me um pouco mais sobre as obras deste escritor.
ResponderEliminarEstou a aguardar que a biblioteca me disponibilize dois livros de autores que, creio, nunca li e que me foram sugeridos por duas colegas de trabalho:
“My Ántonia” de Willa Cather e
“Un Mundo para Julius” de Alfredo Bryce Echenique, escritor peruano.
Já leste alguns livros destes escritores?
Há quase dois meses que estou à espera deles. São livros muito requisitados. Continuo na lista de espera.
Não conheço nenhum deles, CATARINA, mas já reparei que aqui são mais evidenciados escritores diferentes do que aí. Se bem que aos poucos eles vão aparecendo... :)
EliminarDe Murakami gosto muito, sendo que só recentemente o comecei a ler - em 2008, para ser mais precisa! ;)
Mais uma sugestão para juntar a algumas que já por aqui tenho.
ResponderEliminarPor agora, estou a finalizar "O Amor em Tempos de Cólera"
Nunca li, mas tenho-o na minha estante, PEDRO! :)
EliminarIsto de arrumar e limpar estantes antes de férias dá o seu jeito, que vamos anotando uns quantos livros que podemos levar na bagagem... ;)
E eu ainda não comprei os outros três...
ResponderEliminarAndo numa fase de não ler, tenho imensos em fila de espera e a reclamar atenção...acho que tenho que ir de férias mais cedo este ano :p
Fica a sugestão.
Beijinho :)
Bom, é raro, mas de vez em quando também tenho fases dessas, MARIA! :)
EliminarBeijocas!
Conheço o livro mas, tal como outros, não o consegui ler todo. Mas percebi perfeitamente a dualidade entre a realidade e o sonho, tão característico neste autor.
ResponderEliminarBeijocas
Só não acabo de ler os livros que me desagradam, que não percebo, ou que por alguma razão perco o fio à meada, JP! Não gosto de deixar livros a meio, mas de vez em quando lá acontece... :)
EliminarBeijocas!