O meu pai sempre foi a organização em pessoa, com horários muito rígidos que lhe permitiam conseguir o tempo necessário para levar avante todos os seus projectos, quer laborais ou de lazer. Mas, no que tocava a férias, essa característica eclipsava-se completamente...
Se bem que os hotéis algarvios já estivessem fora do alcance da sua bolsa no início dos anos 70 do século passado, o mínimo seria que se informasse atempadamente das condições e preços de apartamentos que albergassem quatro pessoas. Nada disso! Deixava para a última hora e depois perguntava a alguns dos seus colegas ou parceiros desportivos se sabiam de algum, preferencialmente baratinho.
Assim, às vezes íamos passar férias a verdadeiros tugúrios: "uma casa de pescadores junto à praia" não passava de um túnel dividido com cortinas e um sótão, que nem janelas tinha, apenas a porta da frente e das traseiras com um postigo cada uma (nem os ditos "pescadores" lá viviam, servia para alugar a papalvos); "apartamento ultra-moderno com piscina" traduzia-se num apartamento tão moderno que ainda estava em semi-construção, com as camas, cadeiras, mesas e luzes mínimas atiradas lá para dentro, a famigerada piscina sem água, a uns 2 ou 3 quilómetros da praia; "nova urbanização turística com piscina, bar e boite", aí é verdade que tinha isso tudo e até seria aprazível, caso a água corresse nas canalizações, o que só acontecia 3 horas por dia, quase por obséquio. Pior, houve um ano em que por falta de marcação prévia, andámos a saltitar de apartamento em apartamento. Quer dizer, os meus pais andaram, que eu e a minha irmã fomos convidadas por uma amiga para ir para Armação de Pêra, depois das primeiras "mudanças" ficámos descansadas o resto das férias, que por sinal foram bem divertidas!
Desses tempos, recordo também a tralha toda que levávamos no porta-bagagens (e não só!) da carripana: na dúvida, eu e a minha irmã emalávamos quase toda a roupa, afinal adolescente que se preze nunca sabe do que vai precisar para estar à altura da ocasião; o meu pai, que já praticava pesca submarina e ténis, tinha um malão com os apetrechos da pesca, que incluíam fato e espingardas, vá que não possuía botijas de oxigénio e as raquetes e bolas arrumavam-se em qualquer cantinho; a minha mãe, depois de vários desaires em apartamentos mal equipados, transportava metade da cozinha atrás, onde até não faltava a panela de pressão, para além da cadeira de praia, do chapéu de sol, da geleira, etc. e tal.
Em 1977, de regresso a Lisboa num Domingo à tarde, o Morris 1100 teve um treco às portas de Castro Verde - qual autoestrada, qual carapuça? - esparramou as rodas traseiras com o eixo partido e ali ficámos os quatro. Vale que estávamos perto de um posto de gasolina, mas mecânicos só no dia seguinte e em Beja, o carro teve de ser rebocado - depois de tirarmos de lá o que nos fazia mais falta (sem panela de pressão incluída). Conseguimos arranjar uma pensão para pernoitar, onde em cada quarto ainda existia uma daquelas bacias de cerâmica com jarro de água a condizer, montados num tripé de ferro, para realizar a higiene pessoal. Com um calor do caraças, comprámos o bilhete da camioneta para eu e a minha irmã voltarmos a casa no dia seguinte (sem o nosso peso e depois de um "remendo" provisório, talvez os meus pais conseguissem regressar a Lisboa com toda a bagagem) e passámos o resto da tarde à sombra de uma esplanada, onde a minha mãe se indignou com a muita cerveja que os alentejanos bebiam!
Por mim, só estava preocupada se chegaria a tempo de ver um dos últimos capítulos da telenovela "Gabriela, Cravo e Canela", que na época passava na RTP. "Eu cresci assim..."
Ah!Dá um desconto.Se ele era tão organizado,deixava para se "desorganizar" pelo menos uma vez aao ano durante as férias!Que é justamente o período em que deve relaxar e esquecer a burocrata e tensa vida de trabalhador.Quanto a novela,essa foi obra do saudoso baiano Jorge Amado.E como eu adoro gritar ao mundo que a minha Bahia ultrapassa fronteiras,continuo cantarolando com você:"Eu nasci assim,eu cresci assim e sou mesmo assim,vou ser sempre assim:Gabrieeeeellllla,sempre Gabriela!"
ResponderEliminar=))))))
Beijo!!!!
um dia também hei-de visitar o algarve!! :(
ResponderEliminarEra uma grande brasa, a Gabriela!
ResponderEliminar:D
Li este post 3 vezes...não que não o entendesse logo na primeira vez, mas sim porque adorei ler, porque fartei-me de rir e me fez sentir uma saudade imensa das férias que fazia com os meus pais e irmãos :(
ResponderEliminarEste post poderia ter sido escrito por mim para relatar as minhas férias em família, férias de outros tempos...a única diferença é no nº de pessoas, eu tenho 5 irmãos =))... precisava de saber usar todos os smiles que aqui tens para descrever o que senti ao ler-te :)
O meu pai era exactamente assim como o teu, muito rigoroso no trabalho, nos horários das refeições ou de estudo, mas o descalabro total quando chegavam as férias...férias que eram passadas em casas do mesmo género, onde não havia quase nada, mas ao mesmo tempo também não faltava nada, pelo menos nada que nos impedisse de nos divertirmos...a única exigência que o meu pai fazia era que fossem muito perto da praia...houve um ano em que alugámos uma casa de pescadores na Costa da Caparica, no dia em que chegámos com a tralha toda a casa estava alugada outra família, o dono tinha-se esquecido, pediu desculpa, mas arranjou-nos logo outra casa, uma casa minúscula com apenas um quarto e uma cozinha que servia de sala também...mas que tinha um quintal gigante onde estava montada uma tenda de campismo que dava para algumas 10 pessoas e um tanque enorme, que servia não sei bem para quê, mas que passou a ser a "nossa" piscina =))
Foram férias completamente diferentes das que faço agora, mas muito divertidas e com muitas histórias para contar ;)
Amei este post :x
Beijinho :)
O que me ri com as vossas aventuras! Estava mesmo a precisar!lol
ResponderEliminarDeixa-me dar-te os parabéns pela tua escrita, Teté. É deliciosa.
Deixa-me lá ver se consigo dizer outra coisa. As vossas aventuras, em férias, lembraram-me as viagens que fazíamos de França para cá, ou de cá para lá. A tralha era tanta que ainda estou para saber como é que cabíamos todos no carro. Acho que faltava a panela de pressão. Era isso!:))
(pimpolho a chamar)
beijocas
Isso é que eram férias... cheias de aventuras :) o improviso tem dessas coisas e, à distância, mesmo o que correu mal tem um doce sabor... não é?
ResponderEliminaras minhas primeiras férias foram aos 17. trabalhei durante o verão e fui 3 semanas para França e Inglaterra. falta de orçamento, de carro e família numerosa ditavam invariavelmente férias fluviais (o rio passa a 5m de bicicleta da casa onde eu morava). era o que se podia arranjar e, vá lá, a diversão não faltava :)
ResponderEliminarPeço desculpa, Teté, mas fartei-me de rir com essa descrição que me fez lembrar um tio meu. Mas é natural que uma pessoa organizada e rigorosa, procure não ter essas preocupações nas férias.
ResponderEliminarEu ( não sendo uma pessoa organizada, mas profissionalmente rigorosa)só comecei a marcar férias com antecedência há dois ou três anos. Entre outras coisas, sempre gostei de partir pela Europa fora, de carro, sem hotéis marcados ( mas nunca em Julho e Agosto, obviamente) nem itinerário previamente definido.
Férias são férias...
CBO
Oh Tété, onde é que eu já vi este filme?
ResponderEliminarPor acaso nunca tive o azar de passar férios em tugúrios, mas já dormi nalguns e no final ... tudo está bem quando acaba bem.
Estou a ver este filme com a agravante das horas imensas que se perdiam na estrada para chegar a uma lingua de areia.
Gostei muito desta recordação, ou não fosse eu um saudosista nato e residente.
Mas diz lá uma coisa - agora não achas piada a estas estórias?
Beijinho para ti
KIM
Claro que dei desconto, KÁTIA, e nós éramos adolescentes, passávamos o dia na praia, qualquer cama dava para dormir à noite. Quer dizer, no caso da casa-de-pescador-túnel, na primeira noite íamos sufocando de calor no sótão, até descobrirmos que se abríssemos os postigos das duas portas, sempre corria uma aragem por ali... :))
ResponderEliminarAté falhar um episódio da Gabriela me preocupava mais, eheheh! Que, se não sabes, foi a primeira telenovela brasileira a passar em Portugal, com enorme sucesso... :D
Beijocas! :x
E fazes muito bem, VÍCIO! :)
ResponderEliminarA Sónia Braga, queres tu dizer, SISNANDO... :D
ResponderEliminarAh, MARIA, afinal não era só o meu pai que era "despistado" em férias... =))
ResponderEliminarEssa de chegar a uma casa que afinal já estava alugada a outras pessoas nunca nos aconteceu, mas só por acaso, como se pode deduzir do relato. Mas que foram todas inesquecíveis, até pelas surpresas que iam surgindo, não tenhas dúvidas! :D
Embora não seja saudosista, há recordações boas que nos marcam e ficam nas nossas memórias! Se fosse hoje, provavelmente não acharia graça nenhuma, mas na época até tinha a sua piada... mas também já não passo férias assim! :)
Obrigada e beijocas!
Oh, NINA, porque é que achas que o carro não aguentou? Era tanta e tanta tralha, nós já sem o peso pluma de crianças, mal nos podendo mexer no banco traseiro do carro, que não cabia tudo no porta-bagagens, pois... :D
ResponderEliminarNem imagino um viagem dessas de França para Portugal, que do Algarve a Lisboa seriam "apenas" umas 4 horas ou coisa... ;)
Mas pronto, estas aventuras (e desventuras) até tiveram a sua piada! :)
Beijocas e as melhoras para o pimpolho!
É verdade, LUISA, a saudade dessas férias quase de improviso, por muito que provocassem algum refilanço na altura, acabaram por ficar como doces recordações... :)
ResponderEliminarA diversão nunca falta em férias, MOYLITO, quando somos miúdos: qualquer mergulho, nem que seja num laguinho, é sempre brincadeira certa! Depois é que começamos a ficar esquisitos... :D
ResponderEliminarNão faças confusão, também tive férias junto ao rio, que por acaso não ficava a 5 minutos de casa... :)
Um dia destes conto!
Concordo que férias são férias, CARLOS BARBOSA DE OLIVEIRA, mas quando se vai com a famelga (e a bagagem) toda atrás não dá muito para apostar no escuro, não é?
ResponderEliminarLonge de ser um exemplo de organização, enquanto fosse comigo e para a coboiada tudo servia, depois do filhote ter nascido já não. Manias, talvez! :)
Claro que hoje acho piada a estas "desventuras", KIM, este filme não será único, ao fim de uns tempos vira comédia!
ResponderEliminarNa altura não tinha tanta, mas a mais chateada era sempre a minha mãe (que sempre teve a mania das limpezas), em que a maior parte destas casas não passavam ao "teste do algodão"! :D
Mas ficam as recordações desses tempos... :)
Beijocas!
É assim mesmo, férias são férias e o resto é letra. Nós por cá andávamos com a casa às costas a armar barraca pelo país inteiro. E o que gostávamos de montar a tenda logo à chegada à Quarteira. O meu pai indicava o sítio e não havia mais conversa. A manhã estava soalheira e a sombrinha fresca convidativa para montar ali mesmo o acampamento mas, depois do almoço, já não se podia estar sob um sol escaldante e uma estufa insuportável. Tempos maravilhosos em que um mês de férias eram um mês de aventuras. Certa vez, no regresso ainda em terras alentejanas, quase nos íamos esquecendo do meu irmão na casa de banho do tasco!
ResponderEliminarÉ verdade, PAULOFSKI, as férias eram mesmo uma aventura pegada, do princípio ao fim. Não todas no Algarve (nunca fui um mês inteiro), mas os três meses de Verão eram mesmo férias GRANDES!!! :D
ResponderEliminarConheci um fulano que certa vez, ao parar o carro num posto de gasolina para atestar, esqueceu-se que a mulher tinha ido à casa de banho e zarpou sem ela... Quer dizer, depois quando deu por isso voltou para trás, mas imagino a boa disposição da mulher!!! =))
Grande aventura de férias :)
ResponderEliminarFérias grandes e grandes aventuras combinam, LOPESCA! :D
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