segunda-feira, 22 de junho de 2009

O SEGREDO DA CASA DE RIVERTON

A leitura deste romance absolutamente fascinante de Kate Morton (com o título original de "The Shifting Fog") foi demorada, até porque depois não resisti à tentação de ler e reler mais umas passagens, para garantir que não perdera nenhum dos fios desta teia de enredos, que se encontram tecidos numa malha muito semelhante à da famosa série inglesa "Família Bellamy" - que a RTP exibiu lá para meados dos anos 70, para quem se lembrar. Os acontecimentos sucedem-se nos nobres salões, com todo o orgulho e preconceito de uma aristocracia inglesa quase a entrar em vias de extinção, a par de na cozinha, onde a criadagem se reúne, sofrendo também as perdas e amarguras de uma sociedade em transformação, durante e após a I Guerra Mundial.

Grace, a única sobrevivente desta história, tem 98 anos e vive num lar, até ao dia em que recebe uma carta de uma jovem cineasta, Ursula, a pedir-lhe que "desse uma olhada nos cenários" que representam a casa de Riverton, onde a 22 de Junho de 1924 ocorreu a trágica morte de um poeta. Essa carta despoleta uma série de recordações na velha senhora, que passou a vida a fingir esquecê-las, resolvendo, entretanto, relatar ao seu neto, Marcus, todos os segredos que guardou ciosamente para si. Ela entrou em Riverton aos 14 anos, como criada, precisamente pouco antes do início dessa guerra, e manteve-se ao serviço da família por mais de uma década. Agora, velha e cansada, nem forças tem para escrever essas memórias, de modo que as dita para um gravador, numa voz "indistinta, gasta, quase inaudível", diferente da que ouve na sua cabeça e nos seus sonhos.

Entrecortando passado e presente, aos poucos vamos conhecendo as personalidades distintas das duas irmãs, Hannah e Emmeline Hartford, cujo destino se vai entrevendo em cada linha das 472 páginas, lembrando o som do relógio da sala de visitas de Riverton e a "discreta insistência com que marcava a passagem do tempo: paciente, inflexível, frio - como se de algum modo soubesse, mesmo então, que o tempo não era amigo de quem habitava naquela casa." Mas ilusões e desilusões não acontecem apenas na fidalguia, estendem-se aos serviçais, sendo que estes têm uma maior liberdade para sair daquelas paredes ancestrais, mas nem sempre o fazem...

Excelente!!!

CITAÇÕES:

"Desejava independência e aventura, no entanto, era prisioneira - uma prisioneira confortável e bem cuidada, mas ainda assim prisioneira. A independência exigia dinheiro. O seu pai não tinha dinheiro para lhe dar e não a deixavam trabalhar."

" - É um crime absoluto. É o que é. Um inconveniente atroz. A melhor semente de Inglaterra deixada apodrecer nos campos de França, enquanto as jovens senhoras ficam a ver navios, sem sequer ter par para o baile. É uma conspiração, digo-te. Uma conspiração alemã - os seus olhos dilataram-se perante a possibilidade - para impedir a elite inglesa de procriar!"

"Regressámos a Londres no dia 19 de Julho de 1919, o dia da procissão de paz. [...] A tinta com que se redigira o tratado estava ainda húmida, as sanções que levariam à amargura e exclusão responsáveis pela guerra mundial seguinte, mas as pessoas lá na terra desconheciam tudo isto. Pelo menos naquela altura. Estavam apenas felizes por o vento sul não arrastar mais o som da artilharia através do canal. Que nas planícies de França não iriam morrer mais rapazes às mãos de outros rapazes."

"A desilusão era inevitável; depois dos anos 20 veio a depressão dos 30 e depois outra guerra. E as coisas ficaram diferentes depois desta. Da nuvem de cogumelo da Segunda Guerra Mundial não emergiram novos memoriais, triunfantes, desafiadores ou optimistas. A esperança pereceu nas câmaras de gás da Polónia. Uma nova geração de feridos de guerra foi enviada para casa e uma segunda lista de nomes foi gravada na base das estátuas que já existiam; os filhos debaixo dos pais. E nas mentes de todos havia o atormentado conhecimento de que um dia os jovens iriam cair uma vez mais."

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PARABÉNS, MOYLE!!!

(Obrigada, TONS DE AZUL, pela recomendação deste livro fantástico!)

12 comentários:

  1. Ah, olha, sou a primeira e perdi o pio! ;)

    Just Kidding!
    Gostei da descrição. Quando acabar de ler os meus (não serão 1246, mas já são demais para o meu conforto emocional, que stresso imenso só de os ver na prateleira, alguns há anos) volto ao teu blog e faço a respecagem de uma série de títulos que me ficaram. Por ora, bani a compra de livros. Hoje ainda andei a folhear uns, mas só mesmo pelo ´vício' de examinar um livro, senti.lo nas mãos, abri-lo ao calhas e ler duas ou três linhas e imaginar-me a descobri-lo. Enfim, nada que a minha determinação - coadjuvada pelos 17 a 23€ de preço de capa - não controle perfeitamente. É impressão minha ou os livros andam mesmo estupidamente caros? Chiça!!!

    Beijos e boas leituras. O que se segue?

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  2. Começando pelo fim, SAFIRITA, ainda no fim de semana passado falámos nesse preço exorbitante dos livros em Portugal: um amigo meu comprou um livro em inglês pela net e o mesmo título em português para uma adolescente da família (não me lembro do título na "berra", mas não era isso que estava em causa), mesmo com portes e tudo o primeiro saiu a metade do preço! A "cultura livresca" sai cara cá no burgo! Também não consta que os tradutores fiquem milionários com a tradução... :p

    Quanto a este livro, tenho quase a certeza que é a "tua cara"! :D

    Ui, se ficasse stressada de os ver na prateleira "waiting for me", acho que também me dava um coisinha má! E nem tenciono ler todos (os 1248, que o número vai crescendo)... ;)

    Beijocas, que as boas leituras seguem já a seguir (só muito raramente menciono as mais fracotas)! ~xf

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  3. Fantástico, são livros de que gosto, a forma da narrativa, com as suas verdades e realidades daqueles tempos, tem que se lhe diga!
    Tive uma coleção, já não sei se eram sete livros, todos d amesma história passada nos arredores de Londres, minha nossa, adorei aquilo, guardei-os ciosamente, mas foram ao ar na cheia da garagem, como já te tinha dito..a aristocracia inglesa era muito ciente do seu papel...
    Beijinhos, momentinho de leitura bem bom..laura.

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  4. Mais um livro daqueles que parecem ser muito bons...
    Olha, o meu tá enconstado aqui lado e já nem sei se recomeço e ou continuo mas com alguns factos esquecidos :(
    Correria do diaa dia...Afeeeee!

    Bom São João e beijokas!

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  5. aí está um lvro que desperta a minha curiosidade!

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  6. Seria um livro que eu gostaria de ler, pelo enredo, pela historia,.....adoro historias que se passaram em tempos de guerra......
    Mas sabado fui a um grande centro comercial( coisa rara porque detesto centros comerciais) e estive justamente a ver livros que me interessariam, e é de doidos os preços deles...como se pode assim incentivar a canalhada a ler????Claro que eles preferem dar 20€ por umas calças do que por um livro, né!!!!!!

    Em França lia imenso e a maioria dos livros eram acessiveis....aliás ainda em Dezembro comprei lá um de Marguerithe Duras e custou 10€...

    Mas aqui se até os livros escolares são um negácio, como se pode educar este povo e ajudá-lo a ser um pouco mais culto?????
    Pois é o dinheiro das grandes multinacionais fala mais alto.
    Já me deviei do assunto....hihihihih

    Beijokitas

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  7. Costumo comprar os meus livros, e não são poucos, numa Feira Alternativa do Livro que se realiza no Parque das Nações. Não é sempre nem é uma que lá também se faz que só tem livros antigos. É uma feira em que tem vários vendedores e bancas. Costumo comprar a um rapaz que é o Rui almeida que tem sempre as novidades a quase metade do preço.
    Se quiseres posso dar-te o e-mail dele e assim ele vai-te avisando quando se realiza e por vezes até envia listagens!
    Beijos

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  8. 472 páginas? só com letras?
    vou ali apanhar um pouco de ar e já volto...

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  9. a 22 de Junho morreu um poeta mas a 22 de Junho nasceu outro:D

    OBRIGADO :D

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  10. :) Sabia que ias gostar de ler esta história que também tanto me apaixonou!
    Soube bem reler certas passagens e ler a tua crítica ao livro. Beijinho

    P.S. Sim os postais não podiam faltar para a minha colecção. :) Compro sempre um ou dois, mas as fotos são sempre mais.

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  11. Por acaso gosto muito de autores ingleses, LAURINHA, mas esta até é australiana, se bem que tenha retratado lindamente a época, para já não falar das histórias que se entrecruzam, de nobres e plebeus. :)
    O que resta da aristocracia inglesa, ainda continua a ser, com aquele arzinho snob que só eles! :n
    Beijinhos, nina!

    Pois, MYLLANA, há tempos assim, em que a leitura tem de ficar para trás... :|
    Bom São João para ti e beijocas!

    Suponho que és capaz de gostar, TERESA DURÃES! (embora não conheça muito bem os teus gostos literários) ;)

    É um livro que se passa em tempo de guerra, PARISIENSE, mas dos que em casa ficam a aguardar o regresso dos seus soldados, o que me parece igualmente mau, porque nem todos sobrevivem... :s
    E dos anos loucos que se seguiram... :z
    Quanto ao preço dos livros em Portugal, parece-me um bocado "pescadinha de rabo na boca": como há pouca gente a ler, as edições são pequenas e por isso mais caras. Mas como são caras, nem toda a gente tem acesso aos livros que gostaria de ler! :-/
    Da última vez que estive em Londres também encontrei os clássicos de Charles Dickens a 1 libra. Aqui, não passa na cabeça de ninguém livros a 1 ou 2 euros... :(
    Beijokitas, nina!

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  12. Estou interessada nesse mail, sim, RODERICK! E não é que compre muitos livros (muitos deles são oferecidos no Natal, nos anos ou só porque saíram numa revista e não interessam ao próprio), mas gosto sempre de cuscar essas novidades... ;)
    Gracias e beijocas!

    Também tem números, nas páginas e nos capítulos, VÍCIO! =))
    (mas cada um com os seus gostos, né?)

    Ah, MOYLITO, o poeta era um personagem ficcional, mas pensador moylístico só há um... :D
    (só reparei na data da "morte" do poeta quando andava a rever algumas passagens, mas coincidiu!) :)

    Não lhe chamaria crítica, TONS DE AZUL, mas apenas um apontamento! :)
    A única coisa que não gostei no livro foram as gralhas, não sei se de revisão, se de tradução ou ambas. Uma ou outra ainda me parece normal, mas topei várias. :(
    Mas obrigada a ti, que sem a recomendação talvez nunca o tivesse lido... ~c

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Sorri! Estás a ser filmad@ e lid@ atentamente... :)