Antes do pronto-a-vestir em Portugal, mães, avós, tias, costureiras ou modistas cuidavam que não faltasse vestuário às crianças e jovens. Feito à medida, mas com umas bainhas a baixar e um pedaço de tecido para alargar, porque crescer ou ganhar formas diferentes não estava fora de questão, para as estações seguintes. Assim, lá para os 11/12 anos ou coisa, eu e a minha irmã tivemos as nossas primeiras calças compradas numa loja da Avenida Guerra Junqueiro, salvo erro denominada "Lord". E ambas ficámos adeptas tanto do pronto-a-vestir como das calças, com as quais as costureiras e modistas não se ajeitavam...
Contudo, nada mudou muito, o ritual era sempre o mesmo: sapatos iam comprar-se à Praça do Chile (onde eram mais baratos, na "Mariazinha"), convinha ser um número acima para durarem mais tempo; a mamã tricotava as camisolas de Inverno; a vovó e a tia-avó faziam as colchas de crochet para as nossas camas; na baixa, passeio regular passava pelos tecidos na "Frazão". Mas, entretanto, a costureira tinha adoecido, a modista estava assoberbada com vestidos de casamento e nós ambicionávamos ter calças de ganga e camisas "à moda" dos "Porfírios", que ainda por cima não eram nada caras. A minha mãe concordou, mas como não se entendia na loja anos 70, com espelhos, paredes pretas e escadas estreitas enfiadas em túneis, tudo mal iluminado, deixava-nos ir às compras sozinhas.
Dia de baixa lisboeta era para percorrer tudo de lés-a-lés: com começo na loja da nossa predilecção, passando pela "Casa Africana", "Lisbonense" para sapataria, "Polux" para plásticos de forrar livros, papelaria na "Progresso" ou na "Fernandes", no final era impossível não visitar a Rua do Carmo e a Rua Nova do Almada, onde a música estava sempre no ar. E foi num desses dias que entrámos desprevenidas nos "Armazéns do Chiado", em saldos! Perdemos-nos quase imediatamente, na secção de tecidos, com o mulherio a agarrar os rolos de pano como se não houvesse amanhã. Os funcionários não tinham mãos a medir, qualquer toque num trapo suscitava o olhar furioso das que os seguravam com unhas e dentes. O ataque de riso foi tão grande, que nos reencontrámos no meio do armazém a chorar que nem umas perdidas...
Contudo, nada mudou muito, o ritual era sempre o mesmo: sapatos iam comprar-se à Praça do Chile (onde eram mais baratos, na "Mariazinha"), convinha ser um número acima para durarem mais tempo; a mamã tricotava as camisolas de Inverno; a vovó e a tia-avó faziam as colchas de crochet para as nossas camas; na baixa, passeio regular passava pelos tecidos na "Frazão". Mas, entretanto, a costureira tinha adoecido, a modista estava assoberbada com vestidos de casamento e nós ambicionávamos ter calças de ganga e camisas "à moda" dos "Porfírios", que ainda por cima não eram nada caras. A minha mãe concordou, mas como não se entendia na loja anos 70, com espelhos, paredes pretas e escadas estreitas enfiadas em túneis, tudo mal iluminado, deixava-nos ir às compras sozinhas.
Dia de baixa lisboeta era para percorrer tudo de lés-a-lés: com começo na loja da nossa predilecção, passando pela "Casa Africana", "Lisbonense" para sapataria, "Polux" para plásticos de forrar livros, papelaria na "Progresso" ou na "Fernandes", no final era impossível não visitar a Rua do Carmo e a Rua Nova do Almada, onde a música estava sempre no ar. E foi num desses dias que entrámos desprevenidas nos "Armazéns do Chiado", em saldos! Perdemos-nos quase imediatamente, na secção de tecidos, com o mulherio a agarrar os rolos de pano como se não houvesse amanhã. Os funcionários não tinham mãos a medir, qualquer toque num trapo suscitava o olhar furioso das que os seguravam com unhas e dentes. O ataque de riso foi tão grande, que nos reencontrámos no meio do armazém a chorar que nem umas perdidas...
ps - o incêndio do Chiado foi um desincentivo para voltar à baixa lisboeta, a facilidade dos centros comerciais ou das grandes superfícies fizeram o resto!
ps1 - saudades? nem por isso!!!
Fotografia da net.
Não sou de Lisboa, não posso dizer que a conheça bem, mas reconheço bem o "espírito da época".
ResponderEliminarLembro-me do incêndio do Chiado, transmitido pela TV, do princípio ao fim. Fez "doer".
Como referido, a coincidência, ou não, de mais ou menos por essa altura começarem a surgir, em força, os centros comerciais e hipermercados, fez com que nada fosse como dantes.
Naquele dia, virou-se uma página definitivamente.
.
Só vi o incêndio pela televisão, RUI, mas foi bastantes anos depois desta "aventura" no Chiado (a 25 de Agosto de 1988, sem precisar de confirmar no Google)!
ResponderEliminarJá existiam grandes centros comerciais e supermercados, a "nova" era já se adivinhava...
O espírito da época está muito presente no "Conta-me como foi", que é das poucas séries televisivas que não perco... :)
Os "Porfirios" foi uma lufada de ar fresco para o pessoal da minha geração. Á Praça do Chile, ia tomar a vacina na "Assistência de Não Sei Quê". Quanto às outras lojas, não perdia o meu tempo. A não ser no "Valentim de Carvalho" antes do incêndio, para comprar e ouvir os àlbuns de altura.
ResponderEliminarBons tempos!
felizmente não me polui com tão pouca idade!
ResponderEliminarna aldeia é tudo mais simples e sem montras para distrair das brincadeiras que nos davam tanto gozo.
nem sequer conheci o chiado antes do incêndio.
ps1 - pena? não!
Nada disso faz parte do meu passado, pois roupa usavamos pouca (porque era em Africa e era muito calor...hihihihihii) e passava os meus dias vestida com a farda do colégio das madres....
ResponderEliminarMas falando sério, as nossas roupinhas ( somos 3 irmãs) era feita praticamente pela m/mãe que era uma excelente costureira e que nos fazia o que nós pediamos e o que
estava na moda.....
Foi sempre uma mulher muito á frente do tempo dela...( era daquelas que usava chapéu nas cerimónias mais importantes e que ficava tudo a olhar e ela na maior...ahahahah).
Quanto aos centros comerciais detesto, prefiro o comercio tradicional.
Do incêndio do chiado oh se me lembro estava em Paris e eles transmitiram isso quase em directo como se fosse o fim do mundo.
Beijokitas
em muito poucos anos passámos de um país poupadinho a um país ultragastador e muito desse aspecto sai precisamente da evolução registada neste relato. é só estarmos atentos porque as fontes históricas estão em todo o lado.
ResponderEliminar(comecei o comentário por "em muito poucos anos" par não parecer que estava a fazer piadolas com a tua idade :D
Para mim, imbatíveis, imbatíveis, continuam a ser os coelhinhos da Nacional! O melhor bolo do planeta e arredores! (Nem deveria estar a fazer esta publicidade, que estou sempre desejosa de que ainda haja algum quando lá vou;)
ResponderEliminarBelos tempos, sim senhora :)
Sobre a minha indumentária juvenil, este teu post trouxe-me boas recordações, o que fez trazer de volta alguma da minha inspiração para postar sobre um tema semelhante. Do chamado pronto-a-vestir, só me tornei um verdadeiro consumidor quando a moda e os hábitos da adolescência me foram exigindo algum bom gosto e paciência. Há muitos aninhos, eia eu na Rua de Santa Catarina a caminho do cinema Batalha, quando fui arrastado por um amigo para o interior da loja da Porfírios e, à custa de um casaso de napa preto cravejado com botões cromados que me cativou, fui atendido por uma simpática funcionária. Sai de lá satisfeito com a compra mas muito longe de saber que, naquele momento, tinha tido o previlégio de conhecer a minha futura sogra. O casaco há muito que passou à história mas a minha sogra ainda a preservo, com muito gosto :)
ResponderEliminarE esta, hein...
Sabia que as mulheres se peleavam por vestidos em saldo, mas por tecidos? xiça, que coisa...Enfim, lembro que quando ardeu o Chiado, ainda vivia em Pretória, vimos pela Tv, que horror, foi enorme, foi brutal...
ResponderEliminarTu e a tua mana safavam-se nas compras, tá visto..beijinho da laura
Eu não era muito adepto dos Porfirios. Era mais conservador e preferia a Loja das Meias, onde normalmente comprava quase tudo.
ResponderEliminarAo contrário de ti eu tenho muitas saudades, aliás eu tirei um curso de saudosismo e tenho-o exercido ao longo da vida.
Malgré tout, não podemos viver do passado porque o futuro é o presente.
Um beijinho Tété
Os "Porfírios" foram uma lufada de ar fresco para o pessoal jovem nos anos 60/70, CARLOS, tinham um não-sei-quê da moda londrina do "flower power", mais umas camisas à pescador, calças de ganga, minis, midi ou maxi saias, bikinis, que não eram nada ao gosto dos "cotas" da época... :))
ResponderEliminarNaquelas duas ruas (do Carmo e Nova do Almada) tinhas 4 discotecas, lembro-me bem da Valentim e da Melodia, daí o passeio por lá ser imprescindível! :D
Gostei muito da minha infância e juventude, mas não trocava de tempo agora, porque mal ou bem, Portugal evoluiu bastante nos últimos 30 e tal anos! ;)
E julgas o quê, VÍCIO, que nessa altura não brincávamos na rua, com carrinhos de rolamentos, ao berlinde, numa futebolada ou ao mata? Brincávamos, sim! :e
A bem dizer, não (re)conheço o Chiado depois do incêndio... =((
Por acaso, PARISIENSE, foi o "fim do mundo" que todos os lisboetas conheciam, com as obras de recuperação a demorarem um tempão (não sei ao certo, mas suponho que mais de 10 anos!), para além do próprio comércio da zona (e respectivos empregados, muitos deles sem qualquer possibilidade de encontrar um novo emprego, devido à idade) que morreu nesse dia. :(
ResponderEliminarA minha mãe não gostava muito de costura, era mais "tricot" e bordados, mas havia sempre alguém a fazer os vestidinhos para as meninas e para as bonecas da mana! (francamente, eu só tinha dois, que sempre fui mais maria-rapaz) 'Tás a ver alguém hoje perder tempo a fazer vestidos para bonecas? :))
Mas pronto, era assim em Lisboa, suponho que semelhante em outras cidades do país, África excluída, logicamente, que ainda "era nossa", mas à distância de um continente muito diferente... :)
Beijokitas!
Eheheh, MOYLITO, podes fazer as piadolas que quiseres com a minha idade, que não tenho vergonha nenhuma dos meus 50 anos, a menos de um mês dos 51... Até costumo fazer a festa aqui!!! =))
Mais a sério, a diferença maior foi entre os meus 10 e 20 anos, com o 25A a meio. E sim, do 8 de país ultra-conservador e poupadinho, passámos para o 80 do esbanjar à brava, mesmo que no dia seguinte não haja nada para comer... ;)
Tive culpa por preferir as calças de ganga dos Porfírios, aos vestidinhos bordados e amaricados? Talvez, mas não fui a única... :e
Ahahah, PAX, não devias ter dito isso, que pessoalmente não conheço, mas da próxima vez que voltar à baixa não vou esquecer a indicação... Mas pronto, é raro lá ir, não te apoquentes! :))
ResponderEliminarOnde também passava na volta para casa, era numa pequena loja ao lado da Suiça, que vendia os melhores caramelos que já provei (derretiam-se parcialmente na boca, mas no finzinho restava um pedaço que demorava mais a saborear, nham, nham)! Também acho que já não existe, mas a vida é assim! :)
Não me digas que também usaste calças à boca de sino, PAULOFSKI?! =))
Essa de teres encontrado, pela primeira vez, a tua sogra nos Porfírios tem piada! E a loja do Porto ainda existe, a de Lisboa fechou em 2001 (segundo a net)! Mas pronto, agora também não ia comprar lá nada, né? :e
E boas sogras é sempre de conservar rijas e de boa saúde, apesar das múltiplas piadolas sobre o tema (injustas, que só têm em conta as metediças!) ;)
LAURINHA, eram outros tempos, em que o vestuário era feito em casa, daí a luta pelos rolos de pano! Mas ainda hoje me rio ao lembrar a cena, que o mulherio parecia louco... :D
ResponderEliminarO incêndio foi um grande choque, suponho que para a maioria dos portugueses, mais ainda para os que viviam naquela zona, que perceberam que os carros de bombeiros não conseguiram atacá-lo a tempo, devido a umas obras camarárias que impediam o acesso... Nunca se veio a saber se foi posto, ou não! :-/
Mas claro que nos tínhamos de safar nas compras, a alternativa era o gosto da mamã por vestidinhos todos empinocados, que saiam mais caros que as calças de ganga e roupa prática dos Porfírios! :)
Beijinhos!
Na Loja das Meias, KIM? Onde é que aos 14/15 anos tínhamos dinheiro para isso? Nem apetência por roupa clássica, note-se, mas a loja sempre foi carérrima, tenho a vaga ideia que só uma vez comprámos lá uma prenda para a minha mãe, a meias... ;)
Não, esse curso de saudosismo não tirei, suponho que todas as cenas de vida têm o seu tempo e o seu espaço, gosto de relembrar algumas delas, mas o meu lema é mais "Carpe Diem"... :D
Beijinho, amigo!
Os coelhinhos da Nacional, felizmente, não são conhecidos por toda a gente! É que aquilo esgota muito rapidamente e já muitas vezes me aconteceu de me ir a babar pelo caminho e chegar lá e nada! Pareço uma miúda de 5 anos!
ResponderEliminarMas, como em tudo, é uma questão de gosto, há quem os ache enjoativos...
Amanhã vou lá buscar uns quantos, esta conversa relembrou-me o apetite! ;)
Eu descobri os Porfírios só no final dos anos 80 e continuavam a ser a tal da lufada de ar fresco!
:)
Ai, eu sempre detestei ir comprar roupa. Ainda detesto. Era uma guerra em criança comigo. :((
ResponderEliminarPois, sem experimentar não sei, PAX! Bom apetite para os coelhinhos! :))
ResponderEliminarSe ainda eram a tal lufada de ar fresco no final dos anos 80, imagina nos anos 70, em que era a única do género em Lisboa e Porto... :D
Pior que comprar roupa era ir à modista, SUN, que ficava longe para caraças e tínhamos de lá ir várias vezes: levar os tecidos, escolher o modelo e assim; uma ou duas provas; e no final ir buscar a "encomenda". Convenhamos que a baixa e o pronto-a-vestir eram bastante mais práticos! :)
Ainda estive à espera que os descarregassem... estavam quase a chegar e valiam a pena a espera.
ResponderEliminarDesda vez fui muito comedida... só comprei seis! ;)
Pronto, não eram todos para mim... pena.
'Tá visto, PAX, vou ter de experimentar... :))
ResponderEliminarPorfírios que saudades. Baixa de Lisboa de há 30 anos que saudades....... Era eu bem mais novinha quando ia aos porfírios (17, 18 anos) magríssima, lindíssima.
ResponderEliminarSAUDADES? SIM !!!!!!!!!!!!! MUITAS !!!!!!!!! Por tudo!
De tudo!
Porfírios, Valentim de Carvalho, Loja Sol (electrodomésticos, penso que ainda existe), autocarro 21 de 2 andares (Rossio-Av. Berlim, bairro de Alvalade, cinema Quarteto, c.c. Imaviz, c.c. Alvalade, cinemas de salas grandes sem ar condicionado, etc, sapatos le cocq-sportif, bom, enfim, a minha adolescência e juventude passava também por aqui e era tão feliz. Uma paixão maravilha na pastelaria Biarritz. Sei lá, tanta coisa maravilhosa que passou tão depressa. Hoje tudo é diferente para pior, infelizmente. Tenho saudades. Muitas !!!!!!!!!!
ResponderEliminarANÓNIMA: uma coisa é ter boas lembranças da juventude e dos locais que frequentávamos, que nos recordam belos momentos vividos, outra são saudades de um tempo que já passou e não volta. De qualquer das formas, não considero que tudo hoje seja pior, há muitos campos onde houve uma extraordinária evolução. Mas pronto, são opiniões... :)
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